13/08/2016

O pai que Deus escolheu

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Fé é a certeza das coisas que não se veem”, diz São Paulo. Esta fé foi vivida de forma incomparável por São José. O autor da Carta aos Hebreus diz que Jesus aprendeu a obediência pelos sofrimentos. José seguiu os passos de seu Filho, fazendo-se e deixando-se fazer por Ele pai e discípulo, sendo guiado […]

Fé é a certeza das coisas que não se veem”, diz São Paulo. Esta fé foi vivida de forma incomparável por São José. O autor da Carta aos Hebreus diz que Jesus aprendeu a obediência pelos sofrimentos. José seguiu os passos de seu Filho, fazendo-se e deixando-se fazer por Ele pai e discípulo, sendo guiado de forma velada, somente por sonhos; nunca presenciou nada de extraordinário, mas viveu o ordinário de forma extraordinária pela fé.

José não assistiu a um milagre de Cristo, pois faleceu antes de sua vida pública. Sua anunciação foi feita em sonhos, os anjos que se manifestaram aos pastores não lhe apareceram. As ordens de Deus eram sempre por sonhos. José tinha decidido obedecer sem entender e continuar obedecendo sem entender até o fim de sua vida.

O refrão que lhe acompanhou na vivência da santidade no cotidiano foi a oração de Cristo crucificado: “Pai, em vossas mãos, Eu entrego o meu Espírito”. Foi nesta fé que José assumiu a sua missão de SER pai e esposo, ou melhor, um justo e bom ESPOSO e, como consequência, um bom pai.

A fé de José não foi simplesmente iniciada em sua vida como a de Noé e a de Abraão, mas um culminar de desafios, quedas, tropeços, fracassos, soerguimentos, perdão, misericórdia, promessa, esperança, purificação, humilhação, benefícios de penúria, exílios, diásporas, páscoas, numa luta entre o mistério da graça e o mistério da iniquidade. Uma luta em grande frente de batalha, na qual algo novo foi preparado com muito carinho pela providência divina: um povo pequeno, separado do mundo, que à custa de duras provas aprendeu a não apoiar-se na carne, nem no sangue, simbolizado pelo Egito, uma vara seca de bambu que fura mão de quem se apoia nela: “Manterei no meio de ti um resto de gente humilde e pobre: procurarão refúgio no nome do Senhor. O resto de Israel não mais cometerá iniquidade; nunca mais dirão mentiras. De sua boca não escapará mais um modo de falar enganador; mas pastarão e repousarão sem que ninguém os faça tremer” (Sof 3,12-13).

Para triunfar sobre o mistério da iniquidade, Deus escolhe a pobreza, a kènosis, a pequenez, o escondimento, a humildade, a confiança, a caridade, a certeza da esperança como algo impossível de ser destruído, pois pertence a uma realidade que transcende o homem.

“O resto de Jacó será então entre numerosos povos, como um orvalho vindo do Senhor, um chuvisco sobre relva, que nada espera do homem e nada aspira dos filhos de Adão. O resto de Jacó será então entre as nações, no meio de povos numerosos, como um leão entre os animais da floresta, como um filhote de leão no meio de rebanhos de carneiros; quando ele passa, esmaga, despedaça, ninguém pode livrar” (Miq 5,6-7).

Foram ao longo de séculos de tribulações que, silenciosamente, o Espírito de Deus foi gerando os Anawins ou pobres de Javé, pobres de si e ricos de Deus, pois querem o que Deus quer. Joaquim, Ana, Elisabete, Zacarias, João Batista, Matias, Maria e José fazem parte desta geração que prepararam a vinda do Cordeiro.

A Palavra de Deus nos fala que José era um homem justo (Mt 1,19). Que tipo de justo é José? José é um anawin tsadiq. O tsadiq é aquele que reconhece o fundamento absoluto da Lei e seu valor moral e o anawin é o pobre que vive o amor esponsal em querer o que Deus quer, que fecunda a terra como um orvalho, mas que aterroriza o mal com sua alma unificada, como um filhote de leão no meio de rebanhos de carneiros; quando ele passa, esmaga, despedaça, o inferno inteiro treme, ninguém pode livrar”.

José é o homem do Shalom (da raiz shinlamed mem), da paz justa, ou seja, do shalom, da plenitude feliz de sua alma unificada, reunida (Assaph = Iosseph) em Deus e que leva à execução de sua vontade. José, chamado justo, dirige o coração inteiramente para Deus; com toda a sua alma ajustada e com todas as suas forças ele abraça a integridade e a fidelidade autêntica a Deus.

Devido pertencer a uma pequena nação submetida a várias diásporas, o judeu primou pela educação no lar, pois tinha que preservar a sua identidade. Era em casa que se aprendia o idioma do povo eleito, as danças, o canto sacro, o ritual do shabbat. Hoje estamos vivendo situação semelhante, em que a mentalidade do mundo esvazia-nos de nossa dignidade de filhos de Deus. É preciso que aprendamos com José a edificar em nossas casas, pela Fé, uma Igreja Doméstica.

Na Igreja doméstica, o discipulado da pequenez

Na Igreja doméstica da família de Nazaré, Maria é quem leva a humanidade de Ieshuah a José; a mãe protege, cria um ambiente caloroso e pacífico, teme por seu Filho, lhe dá a vida e a percepção de Adonai em si. A mulher é ministra da imanência divina. O pai ajuda a crescer, José ensina sua profissão a Ieshuah e o prepara para a vida. Ieshua será o Naggar, do arquiteto que fez o mundo em sua divindade ao carpinteiro que projeta e esculpe móveis em sua humanidade; o pai é o reconhecimento externo que confirma o que a mãe disse. É o outro, reflexo do “Outro”, desempenha o papel de separação que fará o filho sair da fusão com a mãe, cortando o cordão umbilical em cada fase da vida. Ele nos empurra em direção à vida, é o Deus fora de nós, Deus além de nós, revela o transcendente.

É o olhar de Maria sobre José que comunicará à humanidade de Cristo uma relação sadia com a paternidade divina, pois José foi de todos os homens o escolhido por Deus para ser referencial da sexualidade masculina para a humanidade de seu Filho.

José ensinará a Ieshuah o aramaico, a Torah [1], os salmos e provérbios, as profecias, o conhecimento da flora e da fauna de Israel, as danças que celebram a glória de Adonai, que celebra o Shabat [2], sobe a Jerusalém todos os anos para a festa da Páscoa cantando os salmos das peregrinações.

É preciso que aprendamos com José a sermos pequenos e a formar nossos filhos no discipulado da pequenez. Como? Dando as primícias de nosso tempo e intimidade ao Senhor, na sua palavra, em seu louvor, na benção das refeições, na oferta de vida que parte e transborda na Eucaristia, na vivência da missão de ser homem, esposo e pai, assim como mulher, esposa e mãe, mas em tudo: filhos e almas esposas do Esposo, pois este amor de união de vontades em gratidão e louvor, chamado amor esponsal, é para homens e mulheres, adultos e crianças.

É preciso retornar o costume salutar de pedir a bênção aos pais antes de sair de casa, como abençoar cada refeição; de se ter um oratório em local de destaque da casa para onde se voltem o olhar e coração a fim de agradecer, suplicar, louvar e retornar o costume de orar em família, em honra da Mãe de Deus, nas festas e celebrações. Os filhos que veem seus pais a louvar nos momentos de bonança e tribulação terão uma imagem de Deus forte, que os capacitará a enfrentar os desafios da vida.

Um pai que forma seus filhos no reconhecimento da grandeza de Deus, os levam a participar do exército dos pequeninos, que com a Mulher pisarão a cabeça da serpente e triunfarão sobre o mundo e o maligno, fazendo novas todas as coisas, unidos ao Emanuel e apressando a sua vinda no advento da Nova Jerusalém, onde toda lágrima será enxugada. O mundo antigo desaparecerá, não haverá mais maldição. Todos verão a face do Altíssimo, o seu nome estará sobre suas frontes. Não haverá mais noites, ninguém precisará da luz da lâmpada nem da luz do sol, porque o Senhor Deus difundirá sobre eles a sua luz e reinarão pelos séculos dos séculos (Ap 21,4; 22,5).

Amém. Vem, Senhor Jesus!

Oração a São José

Ó justo José,
Vós que fostes chamado a ser discípulo da pequenez do Emanuel,
Tornai minha alma pequena, pobre e confiante no amor do Pai.
Que à tua semelhança, eu obedeça sem entender
Para que se cumpra em mim a sacratíssima vontade do Altíssimo.
Reúne as potências de meu ser e unifica a minha alma
Para que ame os dois maiores tesouros que o Pai te confiou: Ieshua e Miriam.
A fim de que no Espírito Santo, recupere o sentido do sagrado no mais monótono cotidiano.
Renova a consciência de que meu corpo é templo do Espírito
Para que minha vida se torne uma liturgia
E assim contigo eu faça parte do exército dos pequeninos
Que junto com a Mulher, esmagarão a cabeça da serpente
E acolherão o Esposo nas alegrias eternas da Nova Jerusalém!
Que assim seja por todos os séculos, amém!

Referências:

[1] Torah = a Lei, o pentateuco – os cinco primeiros livros da Bíblia.

[2] Shabat, o dia de descanso, é o símbolo máximo do judaísmo, verdadeira essência da fé judaica.

Assessoria Litúrgica da Comunidade Católica Shalom

(publicado na Revista Shalom Maná)

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