02/06/2016

Meu pet pode ser meu filho?

por Thais Oliveira Psicóloga

Na semana passada me deparei com uma postagem em uma das redes sociais de que participo que se tratava de um anúncio vendendo o serviço de cremação para animais de estimação. O anúncio era belo e apelava para a dignidade que se deve dar ao corpo daquele ente querido que figuraria para sempre nas memórias […]

Na semana passada me deparei com uma postagem em uma das redes sociais de que participo que se tratava de um anúncio vendendo o serviço de cremação para animais de estimação. O anúncio era belo e apelava para a dignidade que se deve dar ao corpo daquele ente querido que figuraria para sempre nas memórias familiares. Coincidentemente, em outra postagem, havia a divulgação de um álbum de fotos de um evento realizado na ocasião do dia nacional da adoção, 25 de maio, por uma ONG que trabalha em prol da adoção de crianças abandonadas. O texto da postagem falava de amor incondicional, encontro, sentido para a vida, cuidado, respeito, dignidade e, sobretudo, da urgência que muitas crianças e adolescentes têm de encontrar um lar, de ter uma família.

Não consegui deixar de olhar para as duas postagens sem compará-las…

Conheço pessoas que dizem que não querem ter filhos por causa das despesas que são altas demais, outras por causa do grande trabalho que dão, outras por causa do corpo que se deforma, outras pela perda da liberdade e por outras justificativas. Por outro lado, há quem os deseje muito e não possa tê-los. Mas é fato: os filhos fazem falta em um lar. Quem quer ser família, quer ter filhos. A dinâmica familiar contempla necessariamente o lugar dos filhos, porque só há pai e mãe se houver filhos. E quando eles não estão presentes, este lugar clama por quem o ocupe.

É neste ponto que lanço meu olhar: há quem escolha eleger animais de estimação para preencher essa falta e os trate com as “regalias” que filhos teriam (ou não), investindo muito dinheiro e tempo em, por exemplo, banho e tosa no petshop semanalmente, ração da melhor qualidade, consultas mensais com veterinário, escola de adestramento, sapatinhos e roupinhas sob medida, brinquedos especiais, passeios, plano de saúde, tratamento dentário, hotelzinho, festa de aniversário, crematório… Muitos dormem na cama e comem à mesa com seus donos, ou melhor, com seus pais, como preferem ser intitulados. É notório que a maioria destas, não são necessidades dos animais, que precisam de muito menos para ter uma vida saudável, longa e feliz. E, embora sejam fieis, carinhosos, companheiros, fofos, jamais conseguirão realizar o papel de filhos que lhes foi incumbido, porque não é de sua natureza, são animais, determinados por seus instintos, não são pessoas.

Verdadeiramente essas são necessidades das pessoas. Cuidar, amar, sair de si, relacionar-se, dar-se ao outro, realizar algo para alguém ou para o mundo são verdadeiras vias de felicidade. Viktor Frankl[1] concebe que a essência da existência humana consiste na sua disposição à autotranscendência, que pode ser definida como a capacidade fundamentalmente humana de sair de si e voltar-se para algo ou alguém que está além de si próprio. Assim, para além da autorrealização, é pela autotranscendência que o ser humano é feliz.

Olhando para o outro lado, eis a beleza e o sentido do ato de adotar. Ao ver a postagem, fui buscar mais informações sobre a ONG[2] e encontrei belíssimos testemunhos de pessoas que se abriram à adoção e, através dela, não só mudaram a vida das crianças que ansiosamente esperavam por uma família, mas, sobretudo, encontraram um novo sentido para as suas próprias vidas, acabando com o vazio que havia.

Ao adotar, descobriram em si capacidades desconhecidas ou adormecidas. A partir da adoção, autotranscendem-se continuamente, experimentando a doação de si ao outro que necessita de seu cuidado, de seu colo, de seu amor, de seu tempo, de sua atenção, de seu sacrifício. E, de tão felizes que se tornam, querem espalhar essa via de felicidade, ajudando outras famílias e outras crianças necessitadas.

Referências

[1] Psicoterapeuta, médico psiquiatra, neurologista e filósofo, fundador da 3ª escola vienense de psicoterapia, a Logoterapia e Análise Existencial

[2] A ONG é formada por pais e mães adotivos que realizam um trabalho de apoio a pessoas e famílias que querem adotar, desde o processo de adoção até a adaptação da criança ao novo lar.

Thais Oliveira

Psicóloga

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